Uma das
principais características dos seres vivos é a sua capacidade de se reproduzir.
Por meio da reprodução os organismos vivos, sejam eles simples como uma
bactéria ou complexos como os mamíferos, mantém seus genes na natureza. Existem
dois tipos básicos de reprodução: a reprodução sexuada e a reprodução
assexuada. A diferença entre as duas reside no fato de que a reprodução
sexuada envolve gametas (células especializadas em reprodução) ao passo que a
reprodução assexuada não envolve gametas. Qualquer um desses dois tipos de
reprodução envolvem processos de divisão celular, seja para formar os gametas
(meiose), seja para se reproduzir por bipartição.
Uma
célula humana é composta de 46 cromossomos. Ao se dividir ela origina duas
células-filhas com 46 cromossomos cada uma. Se a célula-mãe simplesmente se
dividisse, sem nenhuma preparação prévia, o conteúdo de DNA cairia pela metade
a cada nova geração. Assim, cada célula-filha conteria 23 cromossomos, as
quais, ao se dividirem, dariam origem a duas células-filhas cada uma com 11,5
cromossomos cada. Como isso não pode ocorrer, pois haveria perda de informação
genética, as células passam por um processo de duplicação do seu DNA antes de
se dividir.
O ciclo
de vida de uma célula é chamado de ciclo celular. Nele podemos encontrar duas
grandes fases, a primeira chamada intérfase (I) e a segunda
chamada mitose (M). A intérfase parece uma fase da vida da célula
muito monótona. Entretanto, longe disso, a intérfase é um período em que as
células sintetizam suas proteínas, crescem e desempenham suas funções. Já a
mitose é a fase de reprodução da célula, na qual ela originará duas
células-filhas, idênticas entre si.
A
intérfase é dividida em três fases: G1 (do inglês gap =
intervalo), S (de síntese) e G2 (idem
a G1). É no período G1 que a célula cresce
rapidamente, sintetizando suas proteínas, apresentando, nessa fase, os 46
cromossomos. Quando é disparado um sinal para as células se dividirem, como por
exemplo injúria do tecido ou crescimento, a célula entra em fase S, onde
duplicará o seu DNA (sintetizar DNA), passando ao final dela a apresentar 92
cromossomos. Esse é o nosso ponto de estudo, a fase S. Terminada a fase S, a
célula entra em G2, um segundo intervalo onde ela verificará se o
DNA foi duplicado corretamente e se o ambiente é favorável a sua duplicação.
Com todos os pontos de checagem permitindo a sua reprodução, a célula entra em
fase M, já discutida em seus pormenores na disciplina de Biologia Celular, não
sendo, portanto, necessária sua explicação.
Como vimos,
a fase S é uma fase no ciclo celular onde o conteúdo de DNA da célula é
duplicado. Como sabemos, o genoma humano possui cerca de 3 bilhões de
nucleotídeos, distribuídos de maneira não uniforme pelos seus 23 tipos de
cromossomos. O tempo de duração da fase S varia entre os tipos celulares. Por
exemplo, as células do duodeno apresentam um ciclo celular de 24 horas. Dessas
24 horas, 8 a 10 horas são gastas somente na fase S, ou seja, entre 8 a 10
horas a célula realiza a cópia de cerca de 3 bilhões de nucleotídeos. Isso
significa copiar centenas de volumes de grandes enciclopédias nesse intervalo
de tempo, sem cometer nenhum erro de ortografia.
Obviamente
que ocorrem alguns erros durante o processo, entretanto a maioria deles são
imediatamente corrigidos. Os erros que acabam passando desapercebidos ficam
acumulados no DNA, o que representa um dos eventos do processo natural de
envelhecimento.
O
processo de replicação do DNA é realizado por um complexo enzimático chamado de maquinaria
de replicação. A principal enzima desse complexo é a DNA polimerase,
responsável pela polimerização (adição de nucleotídeos) do DNA. A exemplo da
RNA polimerase, a DNA polimerase somente cataliza a reação na direção 5' → 3'.
Essa propriedade traz um pequeno problema para a célula, mas que é contornado
sem maiores problemas e será discutido mais adiante.
O
primeiro passo do processo de replicação do DNA é abrir a dupla hélice,
deixando as bases nitrogenadas expostas e formando o que chamamos de forquilha
de replicação. A dupla-hélice é separada por meio da atuação da enzima DNA
helicase. Conforme a helicase vai abrindo a dupla-hélice,
há um aumento da tensão nas extremidades da molécula, à semelhança do que
ocorre quando dois cadarços enrolados um sobre o outro, que tem suas pontas
pertencentes à mesma extremidade e que são puxadas em direções opostas. Para diminuir
essa tensão, evitando o emaranhamento da molécula de DNA, enzimas chamadas DNA
topoisomerases participam do processo. Elas quebram as ligações
fosfodiéster do DNA pela adição covalente de um fosfato. Essa reação é
reversível, uma vez que a ligação covalente que une a topoisomerase ao DNA
retém a energia da ligação fosfodiéster que foi rompida.
Com
a helicase abrindo a dupla-hélice de DNA pelo rompimento das pontes de
hidrogênio entre as bases nitrogenadas, seria natural que elas tendessem a se
parear novamente, logo após a passagem da helicase. Para evitar isso, moléculas
especiais chamadas genericamente de proteínas ligadoras de fita simples se
ligam à dupla-hélice aberta, impedindo o repareamento das bases.
Vamos
agora verificar como o DNA é efetivamente copiado em uma nova molécula, criando
dessa forma, duas novas moléculas de DNA.
A enzima
responsável pela síntese de uma nova cadeia polinucleotídica é a DNA
polimerase, como já destacado na aula anterior. A síntese do DNA é iniciada em
locais específicos da molécula, chamados de forquilhas de replicação. São nessas
forquilhas que as enzimas helicase e as demais dos complexos iniciaram seu
trabalho. Estudos realizados nos anos 60 demonstraram que a forquilha de
replicação é assimétrica. Isso ocorre devido ao fato de as fitas de DNA serem
antiparalelas, ou seja, uma das fitas é orientada na direção 5' → 3', enquanto
a outra é orientada na direção oposta, ou seja, 3' → 5'. Assim, era de se
esperar que existissem dois tipos de DNA polimerase, uma sintetizando o DNA em
cada sentido. Entretanto, só existe um tipo de DNA polimerase, a qual sintetiza
a cadeia polinucleotídica na direção 5' → 3'. Assim, ela se liga à cadeia 3' →
5', dando início ao seu trabalho.
Como
vimos, existe apenas um tipo de DNA polimerase que é capaz de se trabalhar na
direção 5' → 3'. Então, como seria realizada a síntese de DNA da fita oposta?
Para contornar esse problema, a célula utiliza um mecanismo de “costura para
trás”. A DNA polimerase liga-se ao DNA a uma determinada distância da
extremidade da abertura da forquilha de replicação, passando a sintetizar a
nova cadeia em direção a essa extremidade, ou seja, de trás para frente. Com
isso, temos milhares de pontos de união entre os trechos sintetizados aos
poucos. Esses trechos são unidos uns aos outros pela enzima DNA ligase e
recebem o nome de fragmentos de Okasaki.
Temos
então duas fitas sendo sintetizadas ao mesmo tempo. Entretanto, a fita em que a
DNA polimerase realiza o processo de “costura para trás” (fita 5' → 3') demora
mais tempo para ser totalmente sintetizada, ao passo que a fita 3' → 5' é lida
mais rápido e tem sua cadeia complementar sintetizada mais rápido também.
Assim, a fita 3' → 5' é chamada de fita líder, enquanto a fita 5' →
3' é chamada fita retardada.
Embora
pareça um processo complicado e sujeito a mais erros, o fato da DNA polimerase
catalisar a reação de polimerização apenas no sentido 5' → 3' é de extrema
importância para a realização de uma cópia com alta taxa de fidelidade. Essa
taxa de fidelidade é de apenas um erro para cada 109 pares de
bases copiadas. Levando-se em conta que o genoma de um mamífero possui cerca de
3.109 pares de bases, é de se esperar que ocorram apenas 3
erros no genoma a cada ciclo de divisão celular. Essa alta fidelidade é devido
à DNA polimerase ser autocorretiva, ou seja, antes de adicionar o próximo
nucleotídeos trifosfatado à cadeia crescente, ela verifica se o nucleotídeos
adicionado anteriormente está corretamente pareado. Essa capacidade da DNA
polimerase ser autocorretiva é devido a ela apenas sintetizar uma cadeia
polinucleotídica apenas no sentido 5' → 3'. Caso ela sintetizasse em ambos
sentidos, perderia essa capacidade de verificação, resultando em um acúmulo de
mutações muito maior do que encontramos na célula hoje.
A imagem
acima esquematiza o processo de replicação do DNA. Como vimos, as duas fitas de
DNA são fielmente copiadas, dando origem a duas novas fitas. Em cada uma dessas
duplas-hélices novas temos uma fita que serviu de molde para a síntese da outra
fita. Assim temos que a replicação do DNA é semiconservativa, ou seja, metade
das fitas são conservadas na molécula. A descoberta do funcionamento do
processo de replicação do DNA, junto com o avanço da tecnologia, permitiu aos
cientistas desenvolverem máquinas que fazem exatamente o que ocorre dentro da
célula. Um exemplo disso foi o desenvolvimento de uma técnica chamada PCR (Polimerase Chain Reaction – Reação da Cadeia da Polimerase). Dentro de uma
máquina, o DNA obtido de apenas uma única célula é replicado milhares de vezes,
produzindo quantidades suficientes de DNA para análise. Isso é particularmente
importante em criminalística, onde a presença de uma pequeníssima mancha de
sangue deixa um “impressão genética” do indivíduo. Outra aplicação ocorrem em
casos de suspeita de paternidade. O teste de DNA é realizado com células
presentes no bulbo capilar, do sangue ou da própria mucosa da boca. Para evitar
a remoção de muito tecido, utiliza-se a PCR para amplificar a quantidade de DNA
obtida.