Karl Landsteiner (1868-1943), médico austríaco que se naturalizou
norte-americano, identificou, no início do século XX, uma incompatibilidade
sanguínea entre determinadas pessoas. Ele observou o fato de que quando o
sangue de duas pessoas eram misturadas, vez ou outra, as células conhecidas
como hemácias (eritrócitos) formavam aglomerados, que ele chamou de
aglutinações. A classificação dos tipos sanguíneos como conhecemos hoje, data
de 1902, quando Landsteiner e seus colaboradores conseguiram classificar o
sangue. Embora inicialmente eles tenham classificado os tipos sanguíneos em A,
B, AB e 0 (zero), durante o decorrer dos anos o fenótipo 0 (zero) passou a ser
chamado de O (ó), uma clara referência a se classificar os tipos sanguíneos
apenas com letras.
A descoberta da
incompatibilidade entre os grupos sanguíneos foi de grande importância para a
medicina, pois possibilitou a transfusão de sangue somente entre pessoas
compatíveis, evitando assim a aglutinação do sangue que poderia levar ao
entupimento de um vaso sanguíneo. Por seus trabalhos sobre grupos sanguíneos da
espécie humana, Landsteiner recebeu o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia no
ano de 1930.
A incompatibilidade entre
os grupos sanguíneos se dá pela reação de anticorpos (aglutininas) presentes no
plasma sanguíneo com substâncias presentes na membrana plasmática das hemácias
(aglutinogênios). Assim, pessoas do tipo sanguíneo A tem aglutininas anti-B; pessoas
do grupo sanguíneo B tem aglutininas anti-A; pessoas do grupo sanguíneo AB não
tem nenhuma aglutinina, pois se as tivesse aglutinaria o seu próprio sangue,
uma vez que possui os dois aglutinogênios; pessoas do grupo sanguíneo tipo O
possuem os dois tipos de aglutininas (anti-A e anti-B). Veja a tabela
abaixo:
Assim, classificamos o tipo sanguíneo AB como receptor
universal, pois não tem nenhum anticorpo contra outros grupos sanguíneos e
como doador universal o tipo sanguíneo O, uma vez que as suas
hemácias não possuem
nenhum aglutinogênio e, assim, não são reconhecidas pelos anticorpos do
receptor. Entretanto, fica uma dúvida: se uma pessoa recebe sangue do tipo O,
este contém além das hemácias, o seu plasma, no qual se encontram os anticorpos
anti-A e anti-B. Esses anticorpos não farão o sangue do receptor se aglutinar
do mesmo jeito? A resposta é não, e se explica da seguinte forma: a quantidade
de plasma que o paciente recebe é muito pequena quando comparada com a
quantidade total de sangue que possui. Assim, as aglutininas do doador se
diluem no plasma do receptor causando pouca ou nenhuma aglutinação das suas
células.
DETERMINAÇÃO DO TIPO
SANGUÍNEO
A determinação dos grupos
sanguíneos, procedimento rotineiro em qualquer posto de saúde, é tecnicamente
simples de ser realizado. Para realizar esse procedimento você irá precisar de
apenas uma lâmina de vidro (igual àquelas usadas em microscopia), aglutinina
anti-A e anti-B e duas gotinhas de sangue. Na lâmina pingam-se as duas gotas de
sangue, uma separada da outra e sobre a primeira coloca-se uma gota de
aglutinina anti-A e sobre a outra gota de sangue coloca-se uma gota de
aglutinina anti-B. A definição do grupo sanguíneo da pessoa é feita pela
análise macroscópica dos resultados: se somente a gota de sangue na qual foi
jogada aglutinina anti-A aglutinar, o sangue é do tipo A. Se somente a gota de
sangue na qual foi jogado aglutinina anti-B aglutinar, o sangue é do tipo B. Se
ambas as gotas aglutinares, o sangue é do tipo AB e, se nenhuma das gotas de
sangue aglutinarem, o sangue é do tipo O.
GENÉTICA DOS GRUPOS
SANGUÍNEOS
Como comentamos na aula
passada, os grupos sanguíneos são determinados por alelos múltiplos. Na espécie
humana existem 3 genes que determinam os 4 grupos sanguíneos descritos acima:
os alelos IA, IB e i. O alelo IA determina a presença do aglutinogênio A nas
hemácias. O alelo IB determina a presença do aglutinogênio B e o alelo
recessivo i não determina a presença de nenhum aglutinogênio. Observe a tabela
abaixo para cada tipo de genótipo com seu respectivo fenótipo:
Atualmente sabemos que a determinação dos grupos sanguíneos por
esses 3 alelos ocorre da seguinte maneira. O alelo IA sintetiza uma enzima que transforma o
precursor H no aglutinogênio A; o alelo IB sintetiza uma outra enzima que
transforma o precursor H no aglutinogênio B. Já o alelo i é inativo, não
sintetizando nenhuma enzima e, portanto, não determinando a transformação de
nenhum precursor.
Como vínhamos comentando,
um gene não atua sozinho na determinação de um dado traço e com os grupos
sanguíneos não poderia ser diferente.
A própria síntese do
precursor H depende de outro gene, o qual possui um alelo recessivo que não é
funcional. Assim, indivíduos hh, mesmo possuindo o gene IA, IB ou ambos, não irá produzir o precursor
e, portanto, apresentará o fenótipo do grupo O. Esses indivíduos classificados
erroneamente como pertencentes ao grupo O foram inicialmente descritos em
Bombain, na Índia e o fenômeno passou a ser chamado de fenótipo de Bombain.
Alguns anos antes de
receber o Prêmio Nobel, Landsteiner e seus colaboradores passaram a testar a
interação entre o sangue humano e o de coelhos. Eles injetaram sangue humano
nos coelhos para testar a capacidade dos anticorpos dos coelhos aglutinar as
hemácias humanas. Com esse experimento eles conseguiram identificar outro
sistema de grupo sanguíneo humano, o sistema MN. Como já foi estudado
anteriormente, embora de forma muito generalista, verificamos a existência de
indivíduos com genótipo AgMAgM (grupo M), AgNAgN (grupo N) e AgMAgN (grupo MN). Uma diferença fundamental
existe entre o sistema MN e o sistema ABO: no sistema MN não existe a presença
de aglutininas contra os antígenos M e N e, portanto, não há incompatibilidade
entre indivíduos pertencentes a grupos diferentes.
Temática: Grupos Sanguíneos
Landsteiner e seus
colaboradores, na década de 1940, injetaram hemácias de macacos da espécie
Macaca Rhesus, hoje conhecidos como Macaca mullata, em coelhos. Nesse
experimento eles descobriram um anticorpo contra as hemácias, os quais foram
chamados de fator anti-Rh (abreviatura de anti-rhesus). Ao verificar a ação
desse anticorpo em humanos, eles descobriram que em 85% das pessoas as hemácias
aglutinavam. As pessoas em que as hemácias aglutinavam foram chamadas de Rh positivas e as pessoas em que as hemácias não
aglutinavam foram chamadas Rh
negativas, o que indica a ausência desse fator na membrana das hemácias.
Para saber se uma pessoa
possui fator Rh positivo ou negativo utilizamos o mesmo método da tipagem
sanguínea, entretanto, trocamos o anticorpo anti-A e anti-B por um anticorpo
anti-Rh. Se as hemácias aglutinarem, o Rh é positivo, se não aglutinarem, o Rh é
negativo.
DETERMINAÇÃO GENÉTICA DO
GRUPO RH
O fator Rh é determinado
por um alelo dominante R e seu alelo recessivo r não determina sua expressão.
Assim, indivíduos RR ou Rr (para facilitar vamos passar a usar um traço: R_)
são Rh positivos e somente os indivíduos rr são Rh negativos.
O FATOR RH E A
ERITROBLASTOSE FETAL
Assim como no sistema MN,
o fator Rh não possui anticorpos naturalmente produzidos pelo corpo, sendo
somente produzidos pela sensibilização da pessoa. Essa sensibilização se dá
pelo contato com os antígenos, os quais estimulam o sistema imune a produzir
anticorpos contra eles.
Na eritroblastose Fetal,
também conhecida como Doença Hemolítica do Recém-Nascido, ou simplesmente DHRN,
há a destruição das hemácias do bebê por anticorpos produzidos pela mãe e
passados ao recém-nascido no momento do parto. O termo correto para “destruição
das hemácias” é hemólise (do grego haimos, sangue, lise, quebra, destruição).
Essa doença só existirá no caso em que a mãe for Rh- e o bebê Rh+. Na primeira
gestação, durante o momento do parto, as hemácias Rh+ do bebê entram em contato com o sangue
materno, misturando-se com ele. Essas hemácias Rh+ irão estimular a produção de
anticorpos anti-Rh, deixando, assim, a mãe sensibilizada contra esses
antígenos. Se, em um eventual segundo filho, esse também for Rh+, os
anticorpos produzidos pela mãe durante a primeira gestação passarão para o
filho no momento do parto, causando a destruição das hemácias do bebê, o que
causa anemia profunda e icterícia.
A icterícia (amarelamento
da pele) é causada pelo acúmulo de bilirrubina no sangue, sendo que a
bilirrubina é produzida a partir da hemoglobina no fígado do recém-nascido.
Dessa forma, toda hemoglobina liberada pela destruição das hemácias é
convertida em bilirrubina, tornando a pele do bebê amarelada. Para compensar a
falta de hemácias no sangue devido à sua destruição, a medula óssea então passa
a liberar hemácias imaturas conhecidas como eritroblastos. Um quadro clínico de
icterícia, anemia e eritroblastos circulantes é um forte indicativo de Doença
Hemolítica do Recém-Nascido.
Mas, enfim, todo bebê Rh+,
filho de mãe Rh- terá
DHRN? A resposta é não. Hoje em dia, a mulher Rh- que vai dar à luz a um bebê Rh+ recebe, no momento do parto, uma
injeção de anticorpos anti-Rh que destrói as hemácias Rh+ que se misturaram com o seu sangue,
evitando, assim, a formação de anticorpos anti-Rh.
PROBABILIDADE EM GENÉTICA
Vamos neste momento
lembrar um pouquinho das regras de probabilidade já discutidas durante o Ensino
Médio. Suponhamos que se jogue uma moeda para cima. Qual seria a probabilidade
de cair cara? Obviamente a resposta é que a chance é de 50% (ou irá cair cara ou
coroa). Jogando-se um dado, qual seria a probabilidade de cair o número 3?
Nesse caso, a chance é de 1 em 6 (lembre-se que o dado tem 6 faces), ou seja,
1/6. Então, qual seria a chance de, jogando-se o dado, se obter um número par?
Bom, os números pares encontrados no dado são 2, 4 e 6, ou seja, existem 3
chances em 6, o que, simplificando, dá um valor igual a 2½ ou 50%.
Em genética, há a
necessidade de se saber qual a chance de se obter dois ou mais eventos
simultaneamente, como por exemplo, qual a chance de uma criança ser loira e de
olhos azuis. Nesse caso vamos conhecer duas regrinhas básicas em probabilidade:
a regra do e e a do ou.
Quando queremos saber a
probabilidade de dois eventos ocorrerem simultaneamente, como por exemplo, a
chance de uma criança ter olhos azuis e ser loira, usamos a multiplicação da
probabilidade de ocorrer cada evento.
Assim, se a chance de uma
criança ter olhos azuis é de ¼ e a chance de ter cabelos loiros é de ½, temos
que:
½ . ¼ = 1/8
assim, dividindo-se 1 por
8 temos 0,125. Multiplicando-se o resultado por 100 obtemos 12,5%.
Quando queremos saber a
probabilidade no qual aconteça um evento ou outro iremos somar as probabilidades.
Qual seria então, a chance da mesma criança ter olhos azuis ou cabelos loiros? Somando-se as
probabilidades, temos:
½ + ¼ = ¾
assim, dividindo-se 3 por
4 temos 0,75. Multiplicando-se esse resultado por 100 chegamos ao valor de 75%.
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