Temática:
Sistemas de Determinação Sexual
Então vamos começar com a seguinte constatação: até agora todas as
heranças estavam relacionadas com um grupo de cromossomos conhecidos como
cromossomos autossomos. Esses cromossomos são responsáveis pela determinação
das características dos indivíduos que não envolvem o sexo do mesmo. O sexo é
determinado por um par de cromossomos que são chamados de cromossomos sexuais.
A reprodução é uma característica fundamental de qualquer ser vivo. Por
meio dela a vida se expandiu pela Terra há aproximadamente 3 bilhões de anos.
Basicamente, existem dois tipos de reprodução: a reprodução sexuada e a
reprodução assexuada. Infelizmente os termos usados não condizem com verdade
nesse caso. À primeira vista teríamos a impressão de que a reprodução sexuada
envolve o ato sexual, enquanto a reprodução assexuada não envolve o ato sexual.
O que ocorre é que o ato sexual não é necessariamente obrigatório na reprodução
sexuada. Um exemplo claro desse fato é a reprodução dos sapos. Não há
penetração do macho na fêmea, mas apenas um estímulo sexual gerado pelo
“apertão”, por assim dizer, do macho sobre o ventre da fêmea, que faz com que
ela libere seus gametas na água, onde o macho irá liberar seus espermatozoides
posteriormente, para que haja fecundação. Portanto, reprodução sexuada NÃO
envolve necessariamente sexo, mas obrigatoriamente gametas. Já a reprodução
assexuada não envolve gametas.
Como já estudado anteriormente, os gametas são células especializadas na
reprodução. Elas são produzidas nas gônadas por um tipo de divisão celular
chamada de meiose. Em humanos, a gônada masculina é o testículo, o qual produz
o espermatozoide, e a gônada feminina é o ovário, que produz o ovócito
secundário. Talvez você esteja estranhando o termo “ovócito secundário”. Na
verdade o gameta feminino, na maioria dos vertebrados, é o ovócito secundário,
o qual somente completará sua divisão celular se for fecundado,
transformando-se em óvulo logo em seguida. Em algumas espécies os mesmo
indivíduos são capazes de originar tanto o gameta masculino quanto o gameta
feminino. Nesse caso estamos falando de hermafroditismo, ou espécies monoicas
(do grego mono, um, e oikos, casa). Quando existem indivíduos especializados na
produção de um tipo de gameta e outros no outro tipo, estamos falando de
espécies dioicas (do grego di, dois, e oikos, casa), a exemplo da espécie humana.
Como mencionado anteriormente, a determinação do sexo nas espécies é
caracterizada pela presença dos cromossomos sexuais. Entretanto, algumas
espécies animais, como jacarés, crocodilos e muitas espécies de tartarugas e
alguns lagartos têm o sexo determinado por condições ambientais. Nos
crocodilos, por exemplo, a temperatura de incubação dos ovos é fator
determinante para o sexo do embrião. Se o embrião for incubado em locais onde a
temperatura é relativamente baixa nascerão somente indivíduos do sexo feminino;
já os machos somente nascerão onde o local de incubação dos ovos possuírem
temperaturas relativamente altas. Em tartarugas ocorre exatamente o contrário:
em locais de temperatura alta nascem fêmeas e em locais de temperatura baixa
nascem somente machos.
Na natureza encontramos 5 sistemas de determinação do sexo, o sistema
XY, o sistema X0 (leia-se xis-zero), o sistema ZW e o sistema Z0 (leia-se
zê-zero) e o sistema haploide/diploide.
No sistema XY as fêmeas possuem um par de cromossomos sexuais idênticos,
os quais são denominados XX. Os machos possuem um cromossomo igual ao das
fêmeas e um cromossomo caracteristicamente masculino, o cromossomo Y, sendo
constituído, portanto, por um par XY. Dessa forma, dizemos que o sexo feminino
é homogamético (do grego homo, igual), pois todos os gametas conterão o
cromossomo sexual X.
O sexo masculino é classificado como heterogamético (do grego hetero,
diferente), pois 50% dos seus gametas conterão o cromossomo X e 50% conterão o
cromossomo Y. Em mamíferos, um gene localizado no cromossomo Y é o responsável
pela determinação direta do sexo masculino. Nele encontra-se um gene chamado
SRY, cuja sigla em inglês significa sex-determining region Y. A proteína
codificada por esse gene induz a formação de testículos no embrião, por meio da
ativação de outros genes em diferentes cromossomos.
O sistema X0 é muito parecido com o sistema XY. As fêmeas apresentam
dois cromossomos sexuais X (XX), entretanto, nos machos não existem o
cromossomo sexual Y e dessa forma eles apresentam apenas um cromossomo sexual,
o próprio X. Assim, o que determina ser um macho é a ausência do cromossomo Y.
Um exemplo de animal que possui esse tipo de determinação sexual é o gafanhoto.
O sistema ZW, o qual ocorre em diversos répteis e em algumas espécies de
insetos (mariposas e borboletas, por exemplo) e de peixes, é caracterizado
pelos machos serem classificados como homogaméticos, ou seja, nesse caso eles
possuem dois cromossomos sexuais iguais, que são chamados de ZZ. As fêmeas
possuem um cromossomo sexual diferente, sendo, portanto, chamadas de sexo
heterogamético, possuindo os cromossomos ZW. Ou seja, nessas espécies ocorre o
inverso do sistema XY.
Como podemos perceber no sistema XY quem determina o sexo da prole é o
macho e no sistema ZW quem determina o sexo da prole é a fêmea.
O sistema Z0 restringe-se a galinha doméstica e algumas espécies de
répteis, as quais, a exemplo das espécies pertencentes ao sistema X0, também
não possuem um cromossomo sexual, nesse caso o cromossomo W.
Um caso muito interessante de determinação do sexo ocorre em abelhas e
formigas (insetos himenópteros). Nesses insetos, ocorre o sistema
haplóide/diplóide, nos quais os machos possuem apenas um lote cromossômico e
têm, portanto, apenas n cromossomos. Já as fêmeas são constituídas por dois
lotes cromossômicos e são, portanto 2n. Vamos tomar como exemplo as abelhas. Os
zangões originam-se por meio de um óvulo não fecundado, por um processo
conhecido como partenogênese (do grego partenos, virgem, e genesis, origem). A partenogênese
é, portanto, um processo de reprodução na qual não há fecundação do óvulo por
um gameta masculino. Assim, como o zangão desenvolve-se de um óvulo não
fecundado ele é haploide, possuindo apenas n cromossomos.
As abelhas (fêmeas) se originam dos óvulos que foram fecundados e,
portanto, são diploides, possuindo 2n cromossomos. A diferença entre a rainha e
as abelhas operárias está na alimentação durante a sua fase inicial de vida, a
fase larval. Se durante a fase larval elas forem nutridas com a geleia real
elas tornam-se indivíduos adultos férteis, as quais serão responsáveis apenas
pela reprodução e por isso são chamadas de rainhas. Se, por outro lado, elas
não forem nutridas com a geleia real, elas tornam-se indivíduos adultos
estéreis e farão todo o serviço da colmeia, sendo, assim, chamadas de
operárias.
Mais recentemente foram feitas novas descobertas em relação à
determinação do sexo masculino em abelhas, mais precisamente nas abelhas do
gênero Apis. Segundo esses novos estudos, o sexo não é determinado pelo número
de lotes cromossômicos. Os óvulos haploides possuem apenas uma única versão de
um gene chamado csd, palavra que em inglês significa complementary sex
determiner, cuja tradução é “determinante complementar do sexo”. O csd possui 19
formas alélicas. Se um indivíduo possuir apenas uma versão do gene ele será do
sexo masculino, mas, se possuir 2 versões do gene será do sexo feminino. Como
existem 19 formas alélicas, a maioria das fêmeas são heterozigotas, pelo grande
número de possíveis combinações entre elas. Muito raramente ocorre a formação
de um indivíduo homozigoto para o gene csd, o qual acaba por se desenvolver em
um macho diploide.
Em diversos tipos de plantas o sexo é determinado da mesma forma como
ocorre em animais. O cânhamo e o espinafre, por exemplo, têm a determinação do
sexo de acordo com o sistema XY; já no morango silvestre a determinação do sexo
ocorre de acordo com o sistema ZW.
Na próxima aula continuaremos falando a respeito da herança sexual.
Veremos como ela é transmitida aos descendentes e quais são algumas das
principais doenças relacionadas a esse tipo de herança.
Temática:
Herança Sexual
Vamos iniciar levando-se em consideração a espécie humana. Duas doenças
muito conhecidas têm herança ligada ao cromossomo X: o daltonismo e a hemofilia.
Para compreender como essas doenças são herdadas, vamos ver um caso típico: um
casal normal para o daltonismo tem um filho daltônico. Vejamos abaixo o
heredograma:
Podemos notar que o cromossomo X do filho foi herdado da mãe, enquanto o
pai forneceu o cromossomo Y. Como o daltonismo é uma herança recessiva
relacionada ao cromossomo X, o pai, por ser normal possui o alelo XDY. A mãe, também
normal, possui um alelo XD, mas, para ter um filho daltônico, ela
deve ser portadora do alelo Xd , sendo portanto, XDXd. Observe:
Assim, do cruzamento entre XDY com XDXd, obtemos as seguintes
proporções:
P: XDY x XDXd
G: XD, Y x XD, Xd
F1: XDXD – 25%
XDXd – 25%
XDY – 25%
XdY – 25%
Proporção fenotípica:
50% de chances de mulher normal (XDXD e XDXd)
25% de chances de um homem normal (XDY)
25% de chances de um homem daltônico (XdY)
O mesmo vale para os casos de hemofilia. Essa doença é causada por um
alelo recessivo h localizado no cromossomo X. Assim, indivíduos XH_ serão normais e
indivíduos XhXh ou XhY serão afetados pela doença.
O daltonismo é uma doença que atinge cerca de 5% a 8% dos homens e 0,04%
das mulheres. Essa doença caracteriza-se pela incapacidade de distinguir as
cores. O termo daltonismo deriva do nome do físico John Dalton, o qual
apresentava essa característica. Basicamente existem três tipos de daltonismo.
No primeiro, as pessoas afetadas não distinguem a cor púrpura da cor vermelha;
no segundo, as pessoas vêem a cor vermelha como se fosse a cor verde; e no
terceiro as pessoas não conseguem separar a cor verde da vermelha, vendo as
duas cores como avermelhadas.
O primeiro tipo de daltonismo discutido acima é condicionado por um gene
recessivo localizado num cromossomo autossomo, não tendo, portanto, o mesmo
padrão de herança que discutimos acima. Os segundo e o terceiro tipos são
condicionados por genes recessivos localizados no cromossomo X, seguindo o
padrão acima estudado.
A hemofilia é uma doença na qual, na pessoa afetada, o sistema de
coagulação sanguínea não funciona, e por isso essas pessoas apresentam
hemorragias abundantes, mesmo sendo pequeno o ferimento. O processo de
coagulação sanguínea envolve uma série de reações entre proteínas presentes no
sangue, as quais são codificadas por diversos genes localizados no cromossomo
X. Dentre essas proteínas, está o fator VIII de coagulação sanguínea, cuja
mutação no gene responsável pela sua codificação causa o tipo mais grave de
hemofilia. Pessoas hemofílicas são tratadas com injeções de fator VIII de
coagulação sanguínea extraídas do sangue de pessoas normais.
A distrofia muscular de Duchenne é uma doença genética progressiva e
letal causada por uma mutação no gene que codifica a proteína distrofina, localizado
no cromossomo X. Essa doença afeta um a cada 3500 homens e a pessoa afetada
sofre uma deficiência no suporte muscular, fazendo com que o desenvolvimento do
músculo não acompanhe o do corpo. Os pacientes, quando atingem os 12 anos de
idade, comumente necessitam de cadeira de rodas e morrem de parada respiratória
ao final da adolescência ou pouco depois dos 20 anos de idade. Muitos garotos
também mostram eletrocardiograma anormal, indicando que o músculo cardíaco e o
diafragma também estão envolvidos nessa patologia.
Embora tenhamos falado até o momento apenas nas heranças relacionadas ao
cromossomo X, existentes na espécie humana, uns poucos genes estão localizados
no cromossomo Y. Quando alguns desses genes sofrem uma mutação ele é passado de
pai para filho, uma vez que as mulheres não possuem o cromossomo Y. Assim, os
genes localizados nos cromossomo Y são chamados de genes holândricos (do grego
holos, totalmente, e andros, masculino), embora alguns autores também se
refiram a esse tipo de herança como “herança restrita ao sexo”.
A hipertricose auricular (do grego hiper, excesso, e trichos, pelos) é
caracterizada pela presença de pelos longos nas orelhas, manifestando-se apenas
em homem. Até pouco tempo acreditava-se que a hipertricose auricular era causada
por um gene localizado no cromossomo Y, mas estudos recentes têm demonstrado
que esse gene localiza-se em um cromossomo autossomo. Assim, passamos a
classificar a hipertricose auricular como “expressão limitada ao sexo”.
Algumas outras características têm “expressão influenciada pelo sexo”,
como o caso da calvície. A calvície manifesta-se como uma diminuição
generalizada de cabelos, o que é diferente da perda total de cabelos que ocorre
no topo do couro cabeludo. Alguns estudos têm levantado a possibilidade da
calvície ser causada por um gene dominante autossômico no homem e um gene
recessivo na mulher.
Com essa aula nós chegamos ao final da genética clássica, também chamada
de genética mendeliana.
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