Temática:
Transcrição e Tradução Gênica
Em
primeiro lugar vamos a uma rápida explicação do que vem a ser o
termo “Dogma”. De acordo com o dicionário Aurélio, dogma significa “ponto
fundamental e indiscutível duma doutrina (...)” Assim, o que vamos estudar aqui
tem um peso enorme para a compreensão daquilo que chamamos de vida. Embora os
diferentes tipos de seres vivos possuam discretas diferenças no modo de
expressar os seus genes, o modo de ação geral se dá de maneira idêntica entre
todos os seres vivos (aqui não consideramos os vírus como seres vivos, uma
eterna discussão entre os cientistas).
O esquema acima identifica os principais eventos que ocorrem para que um
gene seja expresso. Vamos detalhar cada evento, mas para isso precisaremos de
muita concentração durante a leitura do texto.
Vamos imaginar uma situação hipotética: você chega a uma sala de aula e
encontra uma mensagem escrita num idioma que você desconhece, mas sabe ao menos
identificar o idioma, por exemplo, o japonês. Como você está curioso em saber o
que significa a mensagem escrita na lousa, você irá pedir a um amigo seu que
traduza essa mensagem, porém o seu amigo não pode entrar na sala de aula para
ver o que está escrito na lousa, pois não é aluno da sua universidade. O que
você faz então?
A resposta mais lógica seria: copio o que está escrito na lousa em um
papel e levo até o meu amigo, que traduzirá prontamente para mim no meu idioma
e assim poderei compreender o que está escrito. Pois bem, é exatamente assim
que acontece dentro da célula. A mensagem escrita na lousa e que não é
compreensível é o DNA. Como o DNA não sai do núcleo celular (já experimentou
tentar tirar a lousa inteira pela porta?) é criada uma cópia dessa mensagem na
forma de mRNA, o qual pode deixar o núcleo celular em direção ao citoplasma
onde estão os ribossomos (o seu amigo que sabe fazer a tradução). Assim, com o
papel na mão, o seu amigo irá fazer a tradução, mas para isso precisará de
outros materiais, como lápis, por exemplo. Os outros materiais que a célula usa
são os tRNAs, os quais você deve lembrar que transportam os aminoácidos. Assim,
com a tradução completa, você é capaz de entender a mensagem e com a proteína
não é diferente, você entende qual é a função dela dentro (ou fora) da célula.
Agora que fizemos uma analogia, vamos aprofundar um pouco mais nos
eventos de transcrição e tradução gênica. A transcrição consiste na síntese de
uma molécula de mRNA a partir de uma sequência de bases nitrogenadas do DNA. A
enzima responsável por essa transcrição é a RNA polimerase. Essa enzima
trabalha somente na direção 5’ --> 3’. Uma vez que o DNA é formado por uma
dupla hélice, qual das fitas deve ser lida para construir uma molécula de RNA
complementar? Bem, como as fitas de DNA são antiparalelas e a RNA polimerase só
trabalha na direção 5’ --> 3’, a fita que deve ser lida é a 3’ --> 5’, o
que irá determinar a síntese de uma molécula de RNA fita simples na direção 5’
--> 3’, o que condiz com o modo de trabalho da RNA polimerase. Moléculas de
RNA polimerase colidem aleatoriamente com as cadeias de DNA, deslizando sobre
ela em seguida, mas prende-se fracamente a ela. Entretanto, quando encontram
uma região específica conhecida como promotor, ela se prende firmemente. O
promotor é uma sequência de nucleotídeos que contém o sítio de iniciação para a
síntese de RNA.
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5’– ATGCGTGTCGATGGCTAGTGCATGTACGCAGCATGCTAGCTAGCTAGCATTGC – 3’
3’– TACGCACAGCTACCGATCACGTACATGCGTCGTACGATCGATCGATCGTAACG – 5’
sítio de iniciação
A figura acima mostra uma região promotora com seu sítio de iniciação.
As regiões em laranja indicam aonde a polimerase irá se ligar e deslizar
até o sítio de iniciação. Após se ligar à região promotora, a RNA polimerase
abre a dupla fita deixando expostas as bases nitrogenadas das duas fitas.
A sequência de bases nitrogenadas da fita 3’ --> 5’ servirá de molde
para a síntese da nova fita de mRNA. Entretanto, por convenção, quando uma
sequência de DNA associada a um gene deve ser especificada, usa-se a sequência
de bases da fita 5’ --> 3’, uma vez que o transcrito terá uma sequência de
bases iguais a esta, exceto pelo fato de possuir uracila no lugar da timina.
Após deixar expostas as bases nitrogenadas da fita de DNA, a RNA
polimerase adiciona monômeros de ribonucleosídeos trifosfatados disponíveis em
uma sequência complementar à da fita molde. Após encaixar esse
ribonucleosídeos, a RNA polimerase desliza sobre a fita de DNA expondo uma nova
região e adicionando, em seguida, os ribonucleosídeos da mesma forma que foi
realizada anteriormente. Esse evento continua até o momento em que a RNA
polimerase encontra uma sequência especial no DNA, o sinal de parada ou sinal
de terminação, no qual a RNA polimerase libera as duas fitas de DNA e a fita de
mRNA recém sintetizada, terminando o processo de transcrição.
A molécula de mRNA recém-sintetizada atravessa o núcleo pelos poros
nucleares indo em direção ao citoplasma, onde irá encontrar as subunidades do
ribossomo no qual iniciará o processo de tradução. Entretanto, os ribossomos
podem ser encontrados livres no citoplasma ou aderidos à membrana do retículo
endoplasmático (nesse caso dizemos retículo endoplasmático rugoso). A escolha
do ribossomo vai depender do tipo de proteína a ser sintetizada. Se essa
proteína tiver de ser exportada para o lado de fora da célula, o mRNA irá se
ligar ao ribossomo do retículo endoplasmático rugoso. Se a proteína tiver de
ficar dentro da própria célula, ela será sintetizada nos ribossomos encontrados
no citoplasma. Não vamos entrar em detalhes a respeito do motivo pelo qual as
proteínas de exportação são sintetizadas no retículo, uma vez que esse conteúdo
já foi estudado na disciplina de biologia celular e biologia molecular.
Uma vez ligado à subunidade menor do ribossomo, dá-se início às ligações
dos anticódons dos tRNA’s com seus respectivos códons do mRNA, se-guindo o
mesmo tipo de pareamento já discutido (A com U e C com G). A subunidade maior
do ribossomo é responsável pela catalisação das reações que criam as ligações
peptídicas entre os aminoácidos. Sempre que um códon é reconhecido por um tRNA
eles se encaixam e é criada uma ligação peptídica entre os dois aminoácidos. Em
seguida, o primeiro tRNA é liberado do complexo, que desliza em direção ao
crescimento da cadeia polipeptídica, deixando um espaço para que mais um tRNA
se encaixe, dando continuidade à síntese da proteína. Esse evento vai ocorrendo
até o momento em que o mRNA apresenta um códon que não codifica nenhum
aminoácido, liberando todo o complexo e terminando, assim, a síntese do
polipeptídio. Se você procurar os códons de terminação no código genético, irá
encontrar as seguintes possibilidades: UAA, UAG e UGA.
Em seguida ocorrem as modificações pós-traducionais, as quais podem
envolver metilações, sulfatações, fosforilações, entre outras diversas reações.
Temática: Processamento do RNA
Durante a aula passada relembramos como ocorrem os processos de
transcrição e tradução gênica. Entretanto, existe uma diferença fundamental
entre o DNA de procariotos e eucariotos, que é a presença de sequência de bases
nitrogenadas dentro dos genes de eucariotos que não codificam aminoácidos na
proteína, ao passo que em procariotos isso não ocorre.
Vamos tentar exemplificar isso de maneira bem fácil. Imagine um manual
de instruções de um aparelho eletrônico. Nesse manual existem todas as instruções
necessárias ao bom funcionamento desse aparelho. Imagine agora que entre os
parágrafos desse manual sejam colocadas frases sem sentido. Embora o texto
tenha sido fragmentado, as instruções ainda continuam lá, sendo necessário
apenas localizá-las de forma correta.
Quando analisamos a sequência de aminoácidos das proteínas de bactérias
observamos que elas são iguais as sequência de nucleotídeos pelas quais foram
codificadas, ou seja, existe uma colinearidade entre elas. Observe a figura
abaixo:
Agora, quando analisamos as sequências de aminoácidos de proteínas de
eucariotos, observamos que essa colinearidade não existe, ou seja, a sequência
de aminoácidos da proteína não é a mesma que a sequência de nucleotídeos
encontrados nos genes que as codificaram. Isso ocorre pelo fato de existirem
trechos de sequência não codificantes, chamados de íntrons (do inglês
intragenic region). As regiões codificantes são chamadas de éxons (do inglês
expressed region). Esses termos foram propostos em 1978, pelo cientista
norte-americano Walter Gilbert (n. 1932).
Como os íntrons não codificam nenhuma instrução para a síntese das
proteínas, eles são removidos no mRNA por um processo conhecido como splicing
genético. O termo splicing pode ser traduzido como “corta e junta”. Nesse
processo estão envolvidas a molécula de mRNA recém-sintetizada, chamada de
pré-RNA mensageiro e um complexo de enzimas nucleares chamadas spliceossomos.
As partículas desse spliceossomo são constituídas de pequenas moléculas de um
tipo especial de RNA, conhecidas como snRNA (do inglês small nuclear RNA –
pequenas moléculas nucleares) e de proteínas específicas. No splicing do mRNA,
as partículas do spliceossomo reconhecem as extremidades do íntron e ligam-se a
ele. A seguir, essas partículas se unem, fazendo uma aproximação das
extremidades do íntron (como se fosse um laço) e cortando o mRNA no limite
entre íntron e éxon, o que acaba por unir dois éxons consecutivos.
Após a remoção dos íntrons do pré-RNA mensageiro, este passa a ser
chamado de mRNA e vai para o citoplasma no qual sofrerá o processo de tradução
nos ribossomos como visto na aula passada.
A existência de regiões não codificantes no DNA de eucariotos
possibilita que durante o processo de splicing do mRNA os éxons sejam
misturados formando proteínas diferentes a partir do mesmo gene de origem. Esse
processo de mistura de éxons é conhecido como splicing alternativo.
Assim, por exemplo, se um pré-RNA mensageiro contém 5 éxons (A, B, C, D
e E) separados por íntrons, no momento do splicing pode ser formados sequência
como ABCDE, CDAEB, EABDC etc.
Outra consequência muito importante decorrente da existência de regiões
não codificantes no DNA está na proteção da própria informação genética, uma
vez que mutações podem ocorrer virtualmente em qualquer região do DNA. Assim,
se ocorrer alguma mutação no DNA de algum procarioto, fatalmente essa mutação
irá atingir um gene. Já em eucariotos existe a possibilidade de que essa mesma
mutação ocorra em algum íntron, ou seja, não afetando o gene. Assim, parece que
durante a evolução, a natureza selecionou esse tipo de DNA em organismos, junto
com outras diferenças, o que possibilitou uma maior complexidade dos organismos
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