O que é o equilíbrio ácido-base?
A este equilíbrio ácido-base podemos dar o
nome de bioeletricidade ou eletridade da vida. E, através desta bioeletricidade
podemos compreender a forma de manutenção e comunicação celular dos organismos
humanos - Conceição Trucom
A qualidade de vida de uma célula está diretamente relacionada à
diferença de potencial (ddp) entre os líquidos intra e extracelulares. É essa
diferença que faz com que a célula pulse, viva! Comunicação celular.
O líquido interno precisa conservar uma carga ligeiramente positiva,
isto é, com o pH ácido. O líquido extracelular, no qual a célula está
mergulhada, por outro lado, tem que ser mantido negativamente polarizado, isto
é, com o pH ligeiramente alcalino.
Qualquer diminuição na diferença entre as cargas bioelétricas desses
dois líquidos refletir-se-á na desaceleração da pulsação celular. E, células
desvitalizadas é um sinônimo de células envelhecidas. O mecanismo mais comum
para que isso ocorra é a acidificação dos líquidos extracelulares, que variam rapidamente
de acordo com o que acabamos de ingerir. Açúcar e farinha branca, frituras em
óleos ranços, alimentos ‘aditivados’ pelo progresso industrial, bebidas gasosas
etc., enfim, tudo aquilo que já conhecemos como alimentos de natureza
bioestática e biocida, são os grandes protagonistas desse quadro onde as
células mortas, igualmente acidificantes, só tendem a acelerar ainda mais o
processo do envelhecimento. Pelo tempo que esse ciclo vicioso estiver em vigor,
o organismo manter-se-á sob padrões de degenerescência orgânica...
Saúde x Ausência de Saúde
Um corpo saudável é (entre outras coisas) aquele cujos órgãos de
eliminação conseguem retirar do organismo tanto a parte inaproveitável dos
alimentos como os nutrientes que naquele momento lhe são desnecessárias e todo
o lixo ácido resultante do metabolismo alimentar e orgânico.
Enquanto os mecanismos de eliminação estiverem saudáveis e a sobrecarga
metabólica não for uma constante, sempre será fácil corrigir excessos
eventuais.
Os problemas começam a aparecer quando passamos a acumular, de forma
ininterrupta, uma quantidade de lixo maior do que conseguimos eliminar. Esse é
o padrão para irmos progressivamente afastando-nos do equilíbrio ácido-alcalino
que mantém a saúde celular.
Como
é realizado o equilíbrio ácido–base?
O
potencial hidrogeniônico (pH) se refere à concentração de íons hidrogênio (H+)
livre. Quanto maior o número de H+ disponível no meio, mais
ácido este se torna, diminuindo os valores do pH. Em contrapartida, quanto
menor for a disponibilidade desses íons na solução, mais básica ela será e o pH
se elevará. A manutenção dos níveis de pH reflete no funcionamento adequado do
organismo. Aqui, entenderemos a importância do pH para o funcionamento
celular e quais as vias que o organismo utiliza para que estes parâmetros não
se alterem significativamente.
O
organismo possui um fluxo constante de gás carbono (CO2), íons
hidrogênio (H+) e oxigênio (O2), obtido por meio do
metabolismo celular (CO2 e H+) e sistema
respiratório (O2). Parte do CO2 gerado passa, por
difusão, pela membrana celular e outra é transportada para o meio extracelular
na forma de íons (H+ e HCO3-). Para
tanto, a água gerada pela associação do O2 e ions H+ se
combina com o CO2, originando o ácido carbônico (H2CO3),
que pode dissociar-se em íon hidrogênio (H+) e íon bicarbonato (HCO3-).
Essa equação é reversível e pode ser catalisada pela anidrase carbônica, como
segue:
CO2 + H2O « H2CO3
« H+ + HCO3-
Essa é a
principal equação do equilíbrio ácido-base no organismo. O aumento de CO2 desloca
a reação para a direita tornando o meio mais ácido, em contrapartida, a
diminuição do CO2 desloca a equação para a esquerda, deixando o
meio mais básico.
A
permeabilidade das membranas ao CO2 é maior do que aos íons H+,
no entanto o H+ é mais permeável do que os íons potássio (K+),
cloro (Cl-) e bicarbonato (HCO3-). O
deslocamento desses íons através da membrana, geralmente, ocorre com o auxílio
de uma proteína carreadora, gerando gasto de energia.
O pH
intracelular oscila nas diferentes células entre 6 e 7,4 devido à variação das
taxas metabólicas e fluxo sanguíneo tecidual. A estabilidade do pH depende da
carga ácida gerada pelo metabolismo celular, somado ao influxo de íons para o
interior da célula, com relação à saída de íons da célula para o líquido
extracelular. O aumento do pH intracelular pode ser controlado pelo tampão
fosfato ou proteínas celulares; através da associação do íon HCO3- com
o H+, que se dissocia em CO2 e H2O
e se difundem para fora da célula; pela difusão passiva ou o transporte ativo
de H+ para o meio extracelular e pela troca de cátions (Na+/H+)
ou troca de ânions (HCO3-/ Cl-) na membrana
celular.
Cada tipo
de célula responde de forma diferenciada às alterações do pH. O cérebro, por
exemplo, é o mais sensível às oscilações do pH devido a pouca concentração de
proteínas no líquido cerebroespinhal. Já os músculos suportam pHs mais ácidos,
pois armazenam o íon H+ temporariamente, liberando-o lentamente
para a corrente sanguínea, o que reduz a oscilação do pH nas outras partes do
corpo.
A
regulação do pH celular está relacionada à contínua liberação de íons para o
meio extracelular, e conseqüentemente para a corrente sanguínea. Além da
produção diária dos ácidos endógenos, o sangue pode receber quantidades
adicionais de ácidos pela via oral ou intravenosa. Para manter o pH
sanguíneo dentro dos limites fisiológicos (7,38 - 7,42) são utilizados
mecanismos como: o sistema tampão bicarbonato, o sistema tampão de
proteínas, especialmente relacionado com a hemoglobina, a regulação pela
respiração e a regulação pelo sistema renal. Abaixo segue uma descrição mais
detalhada dos mecanismos que regulam o pH sanguíneo.
Sistema
Tampão: os
tampões impedem mudanças acentuadas no pH quando um ácido ou uma base é
adicionado. O ácido é uma substância que fornece íon hidrogênio e a base é a
substância que irá se associar ao íon, removendo-o da solução. Os dois tampões
mais importantes no organismo são os tampões bicarbonato e fosfato.
A
proteína mais importante para o tamponamento do pH sanguíneo é a hemoglobina.
Quando a hemoglobina se dissocia do O2, ela pode se ligar a uma
molécula de CO2 ou H+. No interior do eritrócito, o
CO2 e a água podem gerar os íons H+ e HCO3- (como
demonstrado na equação acima), o hidrogênio pode se ligar à hemoglobina e o
bicarbonato e sair da célula para a corrente sanguínea. Na circulação pulmonar,
o íon bicarbonato entra novamente no eritrócito e a reação ocorre de modo
inverso, formando ácido carbônico que se dissocia em água e CO2. O
CO2 sai da célula para a corrente sanguínea, sendo eliminado do
organismo.
Regulação
respiratória: o
sistema respiratório regula o pH por meio da frequência ventilatória. Como o CO2 é
continuamente formado nas células e difunde-se para os líquidos intersticiais e
sangue, o aumento da concentração do CO2 reflete na redução do
pH de todos os compartimentos. Por outro lado, a redução do metabolismo celular
acarreta na diminuição do CO2, elevando o pH. O aumento do CO2 está
diretamente relacionado ao aumento de H+ e ambos estimulam o
centro respiratório para aumentar a ventilação pulmonar a fim de remover o gás.
A eficiência do controle respiratório é de 50 a 75%.
Regulação
Renal: os rins
controlam a concentração de hidrogênio no líquido extracelular através da
excreção de uma urina ácida ou básica. A urina ácida reduz a concentração de H+ dos
líquidos corporais enquanto que a urina básica remove HCO3-.
O bicarbonato é continuamente filtrado pelos glomérulos (o que remove base do
sangue), enquanto que o íon H+ é secretado pelas células
epiteliais tubulares para a luz tubular (remove ácido). A eliminação de uma
urina ácida ou básica está relacionada com a quantidade de íons eliminados. Se
a secreção do H+ for maior que a filtração do HCO3- a
urina será ácida, e se ocorrer o contrário, esta se tornará básica.
As
células epiteliais tubulares, com exceção do ramo delgado da alça de Henle,
secretam hidrogênio para o líquido tubular por um mecanismo de contra‑transporte
de sódio/hidrogênio (Na+/H+). Quando o sódio reconhece
sua proteína carreadora na membrana celular, o íon hidrogênio, ao mesmo tempo,
se combina com a mesma proteína no interior da célula. Como a concentração de
sódio é maior na luz tubular do que no interior da célula epitelial, o íon se
desloca segundo seu gradiente de concentração. Dessa forma, o sódio proporciona
a energia necessária para deslocar o hidrogênio contra o seu gradiente de
concentração, da célula para a luz tubular.
A porção
terminal dos túbulos distais e todo o trajeto ao longo do sistema do duto
coletor para a pelve renal secreta H+ por transporte ativo
primário (< 5%). Elevações discretas na concentração do íon no líquido
extracelular aumentam consideravelmente sua excreção. Quando a quantidade de
íon excede na tubulação renal, outros sistemas como o tampão fosfato e o tampão
amônia auxiliam na remoção do H+. Diferente dos demais mecanismos
utilizados para o controle do equilíbrio ácido-base, o sistema renal atua por
horas ou até dias, para proporcionar o ajuste exato do pH sanguíneo.
Assim,
todos os mecanismos empregados para a manutenção do equilíbrio ácido-base estão
fundamentados na remoção do CO2. Para manter o pH dentro dos limites
fisiológicos são utilizados mecanismos de ajuste imediato como o tampão
bicarbonato, fosfato e proteínas (segundos), ajuste intermediário realizado
pelo sistema respiratório (minutos) ou em longo prazo pelo sistema renal
(horas).
Manutenção
da integridade celular
No
decurso da evolução, elementos como o carbono, hidrogênio, nitrogênio e enxofre
geraram moléculas que estruturaram células, proporcionando a formação de
organismos mais simples como bactérias e fungos, até estruturas mais complexas,
culminando nos vertebrados. Nesta aula, conheceremos os mecanismos utilizados
pelas células para manter a sua integridade.
Como as
células precisam manter seu metabolismo constante, as oscilações iônicas do
meio podem interferir atenuando ou intensificando sua atividade. Desse modo, os
processos que podem controlar as oscilações iônicas da célula, em decorrência
das variações do meio extracelular, precisam ser aprimorados. As membranas
celulares são constituídas por uma bicamada lipídica e por proteínas celulares
que ficam internas ou externas à célula. Além de delimitar a área celular, as
membranas também atuam como barreira seletiva, controlando os elementos que
passam através dela. Assim, todo o transporte para dentro ou para fora da
célula é realizado através da membrana.
Para
compreender o problema de regulação de volume celular deve-se considerar uma
membrana hipotética permeável à água e impermeável aos solutos. Se no meio
extracelular houver aumento do volume de água, o fluxo da água para o interior
da célula aumentará e está inchará. No entanto, após distúrbio momentâneo, o
volume celular é regulado e volta ao seu volume inicial.
Mas, o
que regula o volume celular? Essa regulação não ocorre por meio da variação de
íons como o sódio ou o potássio intracelular, pois as oscilações destes
comprometem o funcionamento de algumas enzimas celulares. Por isso, o volume
celular é controlado através da variação na concentração de moléculas
orgânicas, como os aminoácidos.
Para
entender este processo, uma das hipóteses defendidas é que os aminoácidos
acompanham as oscilações da salinidade, mantendo a célula sempre isotônica em
relação ao meio extracelular. Como isso seria possível? Isso aconteceria
através da regulação dos aminoácidos disponibilizados no interior da célula. A
diminuição da salinidade extracelular induziria a remoção de aminoácidos livres
por meio do aumento da síntese de proteínas ou através da saída dos aminoácidos
pela membrana celular. Esta é outra idéia defendida, na qual se acredita que o
estresse gerado pela baixa salinidade pode provocar a distensão da membrana
celular, possibilitando a saída dos aminoácidos, o que conduziria também certo
volume de água, normalizando o volume celular.
Assim, é
possível que o controle do volume celular esteja relacionado com as
características da permeabilidade da membrana. Seguindo ainda essa linha de
raciocínio, se, ao invés da diminuição, houvesse o aumento da salinidade do
meio extracelular, a célula tenderia a perder água. A manutenção do volume
seria realizada pelo aumento do número de aminoácidos livres, proporcionado
pela degradação de algumas proteínas.
Como
dados que exemplifiquem esta condição, nas fibras musculares dos crustáceos 70
% da concentração osmótica intracelular está relacionada com a presença de
aminoácidos como a glicina. As alterações nas células dos vertebrados, durante
ajustes nas mudanças da salinidade, assemelham-se às dos invertebrados. À
medida que a salinidade do meio aumenta ou diminui, alterações correspondentes
acorrem nas concentrações intracelulares de aminoácidos, que visam à constante
manutenção do volume celular.
Compreendendo
agora que íons como o sódio e potássio podem interferir nas reações enzimáticas
é mais fácil entender a importância dos aminoácidos na manutenção da
osmolaridade. Entretanto, como sempre há exceções, nem todos os aminoácidos
apresentam respostas a osmorregulação celular. Dentro deste grupo está a
arginina e a lisina, que apresentam efeito perturbador sobre o metabolismo das
células.
Deixaremos
de falar agora sobre a osmorregulação para entrarmos em outros mecanismos de
preservação celular, o congelamento. Animais que vivem em regiões extremamente
frias precisam evitar que suas células congelem. Para tanto, existem elementos
químicos que atuam como anticongelantes, impedindo a adição de moléculas de
água à matriz para formar cristais de gelo.
O
glicerol é um componente muito eficaz na redução do ponto de congelamento,
aumentando a tolerância ao frio. Concentrações elevadas de glicerol são
encontradas nos insetos hibernantes e a hipótese defendida é que esta molécula
reduz o ponto de super-resfriamento, aumentando a possibilidade de o inseto
impedir a formação de gelo e/ou protegendo as células contra os danos causados
pelo congelamento, após a formação do gelo.
Algumas
proteínas com propriedade anticongelantes, também, atuam impedindo a formação
de gelo de maneira muito eficiente para algumas espécies de peixe antárticos,
que possuem a peculiaridade de não possuírem glomérulos renais.
Nesses
animais, glicoproteínas pequenas de 30 kDa circulam no plasma sem correr o
risco de serem filtradas pelos rins. Por isso, um rim aglomerular parece ser
uma vantagem adaptativa para os peixes que utilizam substâncias anticongelantes
para se proteger dos danos causados pela formação de gelo.
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