Taxonomia, regras de nomenclatura e importância de seu uso na Botânica

Histórico dos Sistemas de Classificação Biológica e a Importância da Taxonomia

O estudo dos Reinos

 Karl Von Linné, popularmente conhecido como Lineu, assim como outros naturalistas que viveram em meados do século XVIII, acreditava que havia somente 3 Reinos na natureza: o Reino Animal, o Reino Vegetal e o Reino Mineral.  Com o desenvolvimento dos conhecimentos sobre a natureza, os cientistas começaram a observar que havia muito mais semelhanças entre os componentes do Reino Animal e Vegetal do que o Mineral, claramente pelo fato dos dois primeiros serem constituídos por seres vivos. Essa constatação, hoje, nos parece óbvia, mas naquela época serviu de base para o anatomista alemão Karl Friedrich Burdach instituir o termo Biologia para identificar o estudo dos seres vivos, em 1800. Outros naturalistas de sua época, como o alemão Treviranus e o francês Jean-Baptiste Lamarck aceitaram e aprovaram prontamente o uso do termo, que logo se propagou no meio científico.
 O desenvolvimento da recém-batizada Biologia tornou evidente a enorme diversidade de vida, mas os organismos vivos ainda continuavam a ser classificados como animais ou vegetais. Os biólogos consideravam como animais aqueles organismos que eram móveis, que não produziam o seu próprio alimento (heterótrofos) e que apresentavam crescimento determinado e como vegetais os organismos imóveis, que produziam seu próprio alimento (autótrofos) e que apresentavam crescimento indeterminado.  Se tomarmos como exemplo dois organismos como um coelho e um pé-de-alface não restarão dúvidas em qual dos Reinos classificá-los.

Mas será que todos os organismos são tão fáceis de classificar? Onde colocar, por exemplo, os fungos?

 Na época, organismos como bactérias, algas e fungos eram classificados como plantas, enquanto que os protozoários, que também são unicelulares, eram classificados como animais.   Na primeira metade do século XX, após o aparecimento da microscopia eletrônica e das modernas técnicas de análise bioquímica, algumas diferenças marcantes entre os seres vivos puderam ser observadas.   Em 1937, o biólogo francês Edouard Chatton chamou a atenção para o fato de que as bactérias apresentavam uma célula procariótica, isto é, com um núcleo sem membrana e organelas citoplasmáticas desprovidas de envoltórios membranosos, ao contrário dos outros seres vivos observados por ele, que apresentavam célula eucariótica (com núcleo definido e sistemas internos membranosos). Isso justificou a separação das bactérias em um Reino à parte: o Reino Monera.
Na década de 1960, um outro pesquisador e professor de Biologia da Califórnia, Herbert F. Copeland dividiu os seres vivos em quatro Reinos: o Reino Animal (animais), o Reino Vegetal (plantas), o Reino Monera (bactérias) e o Reino Protista (protozoários; fungos e algas microscópicas).  Em 1969, o biólogo norte-americano Robert H. Wittaker reconheceu e ampliou o sistema de classificação de Copeland, no qual incluiu mais um Reino: o Reino Fungi, que incluiria os fungos. Ficou, assim, instituído um Sistema de 5 Reinos. Já na década de 1980, duas pesquisadoras (Lynn Margulis e Karlene Schwartz) reconheceram o Sistema de 5 Reinos proposto por Wittaker, porém fizeram uma pequena reformulação: o primeiro classificava no Reino Protista apenas as algas unicelulares microscópicas e as algas multicelulares de pequeno porte, no qual deixava as algas macroscópicas junto ao Reino Vegetal. Segundo Margulis & Schwartz, o Reino Protista deve incluir todas as algas, independente do seu tamanho. Desta forma, ficou estabelecido o Sistema de Classificação Biológica mais tradicionalmente utilizado.
 Verificamos, portanto, que é característica da ciência classificar os seres vivos, por conta da enorme diversidade biológica tanto de bactérias, fungos, animais como vegetais. A classificação biológica, com seus diferentes sistemas, vem ocorrendo desde a.C., com Aristóteles, e se mantém até os dias de hoje.  Atualmente, vários pesquisadores vêm estudando os seres vivos, utilizando técnicas bem modernas, como as técnicas de Biologia Molecular, que realizam o sequenciamento de ácidos nucléicos.  A partir desses estudos há uma tendência em se ampliar o número de Reinos existentes na natureza. Segundo essa forma de classificação, os seres vivos são divididos em três grandes linhas ou Domínios, cada um com vários Reinos. Esse modo de classificação evidencia a grande diversidade genética dos procariontes.  Hoje há necessidade de se reorganizar a classificação de inúmeros seres vivos, visto que foi agrupado, muitas vezes, por similaridade anatômica, o que em muitos casos foi derivado de convergências ecológicas, sem a existência de uma origem comum.

Regras de Escrita e Nomenclatura Botânica

Atribuir um nome científico, de qualquer categoria, a uma planta envolve o reconhecimento da presença de um conjunto de propriedades, que agregam objetos às classes. Os nomes científicos ou vulgares são uma expressão sintética de um conjunto de propriedades que se consubstanciam num conceito

Karl Von Linné (Lineu), importante estudioso da classificação biológica e um botânico muito respeitado, propôs, durante o século XVIII, algumas regras taxonômicas que até hoje são utilizadas. Algumas dessas regras foram reformuladas e atualizadas, mas a idéia central de Lineu, que era a de agrupar os seres vivos em uma hierarquia de categorias, ainda permanece, bem como algumas regras de nomenclatura: a Nomenclatura Binomial e o uso de palavras em latim para designar os nomes científicos dos organismos.

Com relação às categorias de classificação, Lineu, em seu tempo, descreveu apenas cinco delas: Reino, Classe, Ordem, Gênero e Espécie. Posteriormente, foram acrescentadas mais duas categorias: Filo e Família.

Na Taxonomia de plantas, até bem recentemente era utilizado o termo Divisão ao invés de Filo, o qual era usado exclusivamente para a classificação animal. No entanto, no XV Congresso Internacional de Nomenclatura Botânica, em 1993, o Código Internacional de Nomenclatura Botânica tornou o termo Filo equivalente à Divisão, podendo ser utilizado tanto na classificação de plantas como animais.

 A escrita introduzida por Lineu, no século XVIII, utilizando duas palavras em latim para designar o nome científico de uma espécie se mantém até hoje. É a chamada Nomenclatura Binomial. Vamos conhecer algumas regras internacionais de nomenclatura:

Os sistematas utilizam nomes científicos (binomiais) latinos ou latinizados, sendo que cada táxon possui seu respectivo nome que é utilizado pelo mundo inteiro. A primeira palavra está no singular e consiste no nome do gênero ao qual a planta está sendo designada. A segunda palavra é denominada de epíteto específico. Essa combinação ocorre para que um epíteto específico não seja confundido com outro.

Como determina o Código Internacional de Nomenclatura Botânica (International Code of Botanical Nomenclature – ICBN), tanto o epíteto genérico como o epíteto específico são escritos em itálico ou em negrito nas publicações impressas, sendo sublinhados quando manuscritos; a primeira letra do nome genérico é maiúscula e o epíteto específico é sempre escrito em letras minúsculas.

Alguns exemplos de escrita binomial:

             Phaseolus vulgaris (feijão)
             
Phaseolus = gênero (deve ser escrito sempre com a 1ª letra em maiúsculo).
            vulgaris = epíteto específico (deve ser escrito sempre em minúsculo).

                                   Gênero + Epíteto específico = Espécie
                                   Tanto o gênero como o epíteto devem ser grifados ou
                                   escritos em itálico.
                                  
É importante esclarecer que o nome científico de uma espécie sempre contém duas palavras: uma representando o gênero, e a outra o epíteto específico. A segunda palavra, quando sozinha, é desprovida de valor taxonômico.
- Em alguns casos, o pesquisador identificou precisamente o gênero, mas não chegou à conclusão em relação à espécie daquele organismo. Nesse caso, é comum utilizarmos o termo sp. após o nome do gênero. Ex.: Passiflora sp. à significa que temos uma espécie não-identificada pertencente ao gênero Passiflora (maracujá).

Caso seja mais de uma espécie não-identificada, costuma-se utilizar o termo spp. Ex.: Passiflora spp. à duas ou mais espécies não-identificadas pertencentes ao gênero Passiflora.

- Certas espécies consistem em duas ou mais subespécies ou variedades, como chamamos na Botânica. Como resultado, embora a Nomenclatura Binomial ainda seja à base da classificação, os nomes de algumas plantas podem consistir em três partes: Gênero, epíteto específico e variedade.

Ex.: Prunus persica var. persica  (pêssego) 
      Prunus persica var. nectarina  (nectarina)

- Quando desejarmos mencionar o autor da descrição de uma espécie, seu nome deve aparecer em seguida ao termo binomial, sem qualquer pontuação. Por exemplo:

Bacteriastrum delicatulum Cleve (alga marrom-dourada)
Coscinodiscus radiatus Ehremberg (alga marrom-dourada)

- Quando uma espécie é transferida de um gênero para outro ou quando se muda o nome do gênero, o nome do autor da primeira classificação é colocado entre parênteses.

Ex.: Biddulphia mobiliensis Bailey

Foi alterado para Odontella mobiliensis (Bailey) Grunow

- Quando lemos o nome de determinado táxon (grupo taxonômico em qualquer nível), podemos descobrir a que categoria taxonômica ele pertence devido à terminação da palavra. Por exemplo, os nomes de famílias de plantas terminam em aceae, com muito poucas exceções. Os nomes mais antigos valem como alternativa (sinonímias). Ex.:

            Fabaceae (Família atual da ervilha, antiga Leguminosae)
            Apiaceae (Família atual da salsinha, antiga Umbelliferae)
            Asteraceae (Família atual do girassol, antiga Compositae)


- Os nomes das Ordens de plantas terminam em ales. Exemplos:
            Commelinales (Ordem do milho)
            Agaricales (Ordem do cogumelo champignon)

Exemplo de classificação de um organismo, com todas as categorias:

                        Reino Plantae
                        Filo Anthophyta
                        Classe Magnoliopsida
                        Ordem Fabales
                        Família Caesalpiniaceae
                        Gênero Caesalpinea
                        Espécie Caesalpinea echinata
Nome popular: Pau-brasil

Abaixo coloco um quadro resumindo as categorias de classificação (quadro 1).
Quadro 1 – Terminações latinas de acordo com as regras internacionais botânicas.
Grupo’
Terminação
Exemplo
Divisão ou Filo
-phyta’’
Magnoliophyta
Subdivisão ou Subfilo
-phytina’’’
*
Classe
-opsida
Liliopsida
Subclasse
-idae
Commelinidae
Superordem
-anae
*
Ordem
-ales
Poales
Subordem
-ineae
*
Superfamília
-ariae
*
Família
-aceae
Bromeliaceae
Subfamília
-oideae
Bromelioideae
Tribo
-eae
*
Subtribo
-inae
*
Fonte: MCNEILL et al. (2007); JUDD et al. (2009),modificado.

’ as principais categorias estão indicadas em negrito.
’’ a menos que o táxon seja uma divisão ou filo de fungos, deve terminar em: -mycota.
’’’ a menos que o táxon seja uma divisão ou filo de fungos, deve terminar em: -mycotina.
* não há esses taxa na classificação das bromélias, exemplificando o quadro.


A Importância do Uso das Chaves de Identificação na Botânica
  
 Chamamos de chave de identificação um compêndio de informações relativas a variados táxons, no qual, passo a passo, podemos chegar à identificação de uma determinada planta.  Há várias chaves de Botânica na literatura específica, algumas com o intuito do pesquisador chegar a uma Família de plantas, por exemplo; outras, com o intuito de se identificar mais precisamente um vegetal, até gênero ou espécie.  É indispensável, no entanto, que quando chegar ao ponto final da chave e tiver encontrado o nome da Família, recorrer a um livro-texto (como o Joly) para confirmar a identificação com uma descrição completa das características da Família.

Por que é necessário identificar um material botânico?

 A identificação é necessária, pois o estudioso pode, por meio da correta e precisa identificação de uma planta, somada a conhecimentos prévios sobre aquela espécie, utilizá-la como fonte de princípios ativos medicinais; mantê-la em uma coleção de plantas no sentido de compartilhar experiências com outros pesquisadores do mundo; reconhecer plantas tóxicas de forma mais rápida, não cometendo erros; entre outros benefícios.  Para a correta identificação de um vegetal, no entanto, é necessário realizar a coleta do material. A coleta de amostras vegetais; o seu preparo e a cuidadosa anotação das informações do local e da planta são fundamentais para a sua correta identificação.
  
Alguns cuidados são necessários nas atividades de coleta:
 Primeiramente porque com a importância que o conhecimento da biodiversidade vegetal apresenta ultimamente; com a preocupação que a sociedade atual se manifesta em relação à preservação de nossas florestas e com a legislação específica que vários governos adotam, a coleta deixou de ser uma atividade simples, necessitam, algumas vezes, de permissão para se retirar uma amostra de planta de um local.

A importância da coleta de amostras e os cuidados que devem ser tomados:

 Chamamos de excicatas as amostras vegetais devidamente preparadas; retiradas da planta, prensadas e secas. Tais excicatas devem conter estruturas vegetativas e reprodutivas, como flores e frutos, sempre acompanhadas de etiqueta que deverá conter informações a respeito da planta coletada e do local de coleta.   Segundo DI STASI (1996), as excicatas são importantes instrumentos na identificação das plantas, pois desde que armazenadas em locais adequados, permitem a utilização por pesquisadores sem a necessidade desses se deslocarem até o local de coleta; permitem um estudo mais aprofundado de suas características morfológicas e podem conter informações sobre o local de coleta; mapas; desenhos; fotos e outras informações importantes a respeito da planta.

 As amostras coletadas devem ser representativas do aspecto geral da planta. Devem-se sempre escolher as partes da planta que apresentarem maior representatividade para a Taxonomia do grupo, contendo, no caso das plantas superiores (fanerógamas), flores e frutos. Deve-se também tomar cuidado para não coletar plantas que estejam sendo atacadas por fungos e insetos; plantas que tenham suas folhas amareladas, manchadas, rasgadas.  A maioria das chaves de identificação utiliza como base a flor e o fruto. As folhas e ramos também são úteis na identificação, apesar de não serem os principais órgãos analisados.  Alguns autores consideram que, geralmente, amostras com frutos têm menor valor taxonômico do que as com flores, pois são insuficientes para a classificação. Em alguns casos, no entanto, a coleta de frutos é imprescindível, pois são muito peculiares àquela determinada espécie ou Família.

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